O maior avanço científico do século XVII foi a descoberta da circulação do sangue e o desenvolvimento da metodologia científica pelo inglês WILLIAM HARVEY (1578-1657), que foi bastante criticado por seus colegas da época, que afirmavam que ele estava redondamente errado. "Você está errado, Harvey", era o que o grande gênio ouvia diariamente de seus colegas. Pena que ninguém sabia que a visão do gênio vai mais longe que as palavras dos meros mortais. Embora menções existissem sobre a circulação do sangue, como a descrição da circulação pulmonar por IBN AN NAFIS (1210-1280), a de MICHEL SERVETUS (1509-1553), a de COLUMBUS (1516-1560) e a de ANDREAS CESALPINUS (1524-1603), a elaboração não apenas da teoria mas a comprovação morfológica e experimental da circulação do sangue por HARVEY criou uma nova era no pensamento humano - a Era da Experimentação Clínica. HARVEY legou para a história da medicina o raciocínio lógico, onde o médico não é obrigado a aceitar uma teoria apenas porque ela é bonita e conveniente, ou porque ela foi elaborada por alguém famoso e influente. HARVEY rejeitou definitivamente a teoria de GALENO sobre a circulação do sangue e ensinou a todo médico que ele não deve acreditar em tudo que lhe é informado. Deve confirmar tudo que for possível. Esta é a única maneira de existir progresso, evolução e conhecimento. Entretanto a grande maioria dos médicos da atualidade ainda não assimilou o espírito clínico inquiridor de HARVEY, aceitando passivamente informações, uma pequena minoria denuncia e critica tudo, sem propor construir alguma coisa, o que é pior.
HARVEY entretanto, era um monarquista convicto e não apoiou partidos de oposição na sua época. A Revolução Francesa somente aconteceria em 14 de julho de 1789, 132 anos após a morte de Harvey. Os políticos da época exigiam mudanças na Inglaterra, pois havia muita concentração de renda, enquanto que o povo padecia de problemas comuns de saúde e existiam poucas medidas reais visando beneficiar a saúde da população. Como HARVEY insistisse em se omitir de participação política, sua descoberta recebeu violenta oposição principalmente pelos grandes nomes da época, todos seguidores de GALENO (130-200 A.D.) e outras autoridades do passado, munidos de grande dose de inveja e cobiça. HARVEY tratou-os com indiferença, preferindo não criar polêmica, pois seus colegas que estavam mais interessados em criticá-lo do que em provar que estava errado. Defendia a idéia de que a melhor atuação política era a produção, e não a discussão, algo comum naquela época. HARVEY era um monarquista amigo do rei CARLOS I e continuou seu trabalho.
William Harvey nasceu em Folkstone, Kent, Inglaterra em 1 de abril de 1578 e morreu em 3 de junho de 1657 em Londres. A coragem e persistência de Harvey, sua penetrante inteligência e metodologia precisa marcaram época na história da medicina. Estudou em Cambridge de forma interrompida pois se supõe que sofria de malária, que o limitava bastante. Mas mesmo assim conseguiu se graduar em 1597. Determinado a continuar seu treinamento médico, iniciou um período de estudos de dois anos e meio na Universidade de Pádua, considerada a melhor escola médica da Europa na época. Em 1600 quando estava estudando em Pádua conheceu uma nova bebida, quente como o inferno, preta como o carvão, pura como um anjo e doce como o amor - o café. Ao regressar para a Inglaterra levou consigo grãos da bebida e passou a promover e divulgar o consumo de café entre seus colegas e pacientes, como uma bebida agradável e estimulante do intelecto, ao contrário das bebidas alcoólicas que eram moda na Inglaterra do Século XVII. No seu leito de morte disse que o café foi a bebida mais saudável e agradável que conheceu em vida.
Seu professor foi o grande anatomista Hieronymus Fabricius ab Aquapendente. Naquele época acreditava-se que os vasos sanguíneos continham ar e sangue, uma idéia de Aristóteles no Século IV a.C. . Galeno, o médico greco-romano, no Século II de nossa Era provou que as artérias contém apenas sangue e presumiu que o ar entrava no lado direito do coração através dos pulmões. Acreditava-se que a circulação era um movimento tipo as ondas do mar, onde o sangue vinha e voltava do coração. Mas Galeno imaginou que o sangue era levado pelas artérias e trazido pelas veias até o coração, sem comprovar sua hipótese. Acreditava que o sangue era formado no fígado, passava pela aurícula direita (câmara superior direita do coração) e daí ia para o ventrículo direito (câmara inferior direita) onde se misturava com o sangue das artérias que era misturado com o ar oriundo dos pulmões. Para isto Galeno acreditava que havia um septo ou perfuração entre os ventrículos, o qual era visto e comentado por anatomistas da Idade Média, temerosos de contrariarem os ensinamentos de Galeno. Harvey questionou a existência deste septo e o movimento do sangue, demonstrando experimentalmente que o sangue se move da forma com que conhecemos na atualidade. Descobriu que, ao contrário do que afirmava Galeno (131-210), o sangue não fluía e refluía no mesmo vaso, seguindo apenas numa única direção, seja do coração para os tecidos, pelas artérias, ou no sentido inverso, nas veias. Percebeu também que o coração bombeava três vezes o peso do corpo em quantidade de sangue e que este circulava em um circuito fechado: coração-artéria-tecidos-veias-coração.
William Harvey foi médico da corte de Jaime I (1603/1625) e Carlos I (1600-1649) e teve como cliente Francis Bacon. Apesar da oposição inicial dos doutores da época, suas idéias foram aceitas e divulgadas por Descartes, que sofreu sua influência na composição da quinta parte de Discurso do Método e em toda As Paixões da Alma. A teoria da circulação sanguínea de Harvey foi publicada na sua obra A Propósito dos Movimentos do Coração e do Sangue (1628).
A descoberta da circulação de HARVEY levou a duas conclusões lógicas: a possibilidade do uso intravenoso (IV) de medicamentos, uma pesquisa efetuada em 1656 por Sir CHRISTOPHER WREN, assistido por BOYLE e WILKINS; e a possibilidade da transfusão de sangue.
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